quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Será?

As amigas mais próximas de Amanda já a tinham alertado para o jeito um tanto quando afeminado de Fernando.

- Amiga, você não acha que o Fernando é assim... meio...

- Assim como, Alice? – perguntou a desconfiada Amanda.

- O povo está dizendo que ele não gosta muito de...

- Não gosta do que? Fala logo!

- Amanda, ele faz pilates! Você conhece algum homem que faça pilates?

- Claro que conheço. Vários. Tem o... Como é mesmo o nome dele?

- Tá vendo? Nem mesmo você sabe. Mas se eu te perguntar quem do teu setor vai jogar futebol na causa do Claúdio as quartas à noite você escala o time todinho.

- Mas é claro. Eu que tenho de ficar até mais tarde porque, quando são cinco horas, eles já estão todos de meião e chuteiras, só esperado o horário de bater o ponto.

- Pois é exatamente aí que eu queria chegar. Homem gosta mesmo é de futebol, tomar cerveja, sair com os amigos pra falar ou fazer sacanagem e com o Fernando não é assim.

- Como não? Agora mesmo, enquanto eu estou aqui contigo, ele está com os amigos dele do curso de Sensitivação Oriental.

- Curso de que?

- Sensitivação Oriental. É uma nova modalidade de autoajuda em que as pessoas contam suas experiências e angústias. Diz ele que lá as pessoas costumam se abrir para novas experiências e que tem aprendido muito com isso.

- Sei. Amanda, abre este teu olho. E a amizade dele com aquele outro lá, o tal de Renato.

- O que é que tem? São amigos, ora. Assim como eu e você.

- Amiga, ele chama o Fernando de “Fê”.

- Carinho, ué?

- E o Fernando ainda completa chamando o outro lá de “Rê”. Me poupe né?

- Ah, Alice, quer saber. Você é muito mal amada e fica com essas histórias de implicância com o Fernando.

- Vou te dar mais uma prova: o que ele gosta de ouvir? Que música ele veio ouvindo no carro quando te deixou aqui? Aposto que foi Lady Gaga.

- Ai, amiga, eu também gosto de Lady Gaga.

- Você, o “Fê” e todos os meus amigos que gostam tanto de homem quanto eu.

- Sabe de uma coisa? Não quero mais conversa com você!

- Tudo bem. Só estou te dizendo o que ninguém teve coragem. Todo mundo fica falando pelas costas. E eu tive coragem de te vir aqui e te dizer. Amiga, se é que você ainda vai continuar minha amiga, observa mais as atitudes dele. Faz um teste com ele. É isso! Faz um teste!

- Que tipo de teste?

- Pede para ele comer uma manga.

- Uma manga?

- Se ele for macho mesmo, vai comer sem se preocupar em se lambuzar todo e ainda vai tentar ficar tirando os fiapos dos dentes com as unhas.

- E onde é que vou arranjar manga uma época dessa?

- Olha só! Tá querendo fazer né? Até você desconfia.

- Chega, vamos parar com essa conversa. Até outro dia!

Amanda saiu sem se despedir de Alice. Apesar de estar querendo sentir ódio da amiga, ela ligou o desconfiômetro.

- Será, hein? – pensou.

Na volta pra casa ainda passou no supermercado. Entre uma prateleira e outra resolveu ir até o setor de frutas.

- Moço, onde eu encontro manga? – perguntou ao atendente.

- Senhora, nessa época é difícil encontrar. Só na Ceasa.

Não, não! Teste da manga, não. E ficou pensando em algumas situações que poderiam tirar a prova dos nove.

- Amor, vamos dar uma volta hoje? Só nós dois! Estou querendo uma noite bem especial com você – era o convite para o grande dia.

- Claro, baby! O Rê tá terminando um relatório aqui e hoje não tenho aula do grupo de Sensitivação, pois o mestre tá dodói. Oito horas tá bom pra você?

- Tá ótimo. Mas oito horas mesmo, tá? Porque você demora muito tempo tomando banho e acaba se atrasando.

- Demoro porque fico passando meus cremes e me preparando pra você, honey.

- Tá certo, então. Oito horas! Beijos e até mais!

- Bye, Amandita!

Enquanto se arrumava, Amanda pensava: “Rê”, “dodói”, “baby”, “bye”, “Sensitivação Oriental”. Mas será?

Fernando chegou quase nove horas.

- Vamos, baby! Me desculpa, o Rê demorou demais a entregar o relatório e não posso sair com você todo sujo e fedorento.

- Tá bom! Vamos lá!

Amanda prestava atenção em cada gesto: a mão arrumando a sobrancelha, a forma de ajeitar o cabelo como se quisesse jogá-lo pra trás da orelha (como fazem as mulheres), como sentava, andava, tudo. E pensava...

- Meu Deus, será?

No restaurante, sentados, um diante do outro, Amanda olhava fixamente para o seu amado.

- Honey, você está bem? Tô te achando tão pra baixo hoje. Me perdoe pelo atraso. Sinto muito mesmo.

- Tudo bem. Chama o garçom que quero beber alguma coisa.

- Pois não, o que o senhor deseja? – indagou o garçom.

- Me traga uma caipifruta de kiwi, com pouco gelo e adoçante. – respondeu Fernando enquanto era observado com a cara de espanto e decepção de Amanda.

- E a senhora?

- Uma cerveja, mas tem que ser bem gelada. – suspirou e questionou pela última vez: “Será?”