terça-feira, 22 de julho de 2014

Três centímetros

Minha estatura nunca foi problema quando se trata de relacionamentos, até o dia em que me apaixonei por alguém com três centímetros a mais que eu.
Era pra ser uma noite perfeita, quando ela iria conhecer meus amigos na colação de grau de um deles. Mas um gesto mudou tudo.
Até então tudo corria perfeitamente. Como era uma festa onde todas as mulheres gastam até o que não podem para ficarem mais bonitas, Cláudia usava um vestido longo vermelho, um penteado que deixava o pescoço à mostra – o que a deixava ainda mais sensual, com aqueles pequenos fio de cabelos que escorrem pela nuca  – e, claro, um salto que me já me deixava  em uma condição um pouco mais inferior,
mas aquilo não era problema.
Um ou outro comentário do tipo:

- Nossa, como ela é linda.

- É sim!

- E bem mais alta que você!

- É que depois de algum tempo resolvi  praticar escalada.- respondia com bom humor.

Até que em uma roda de conversa, quando todos estávamos em pé, Cláudia um pouco cansada fez um breve movimento com o cotovelo e o encostou em meu ombro. Precisava fazer aquilo?
Naquele momento, os três centímetros transformaram-se em uma diferença absurda. Sabe quando você está cansado e se debruça sobre o balcão de um bar? Me senti assim, um encosto, um balcão, um banquinho em que você encosta o pé para poder descansar um pouco. Ainda pensei em fazer um gesto bruto e ela se desequilibrar, mas não podia ser rude com a mulher que até então eu amava.

Tranquei a cara até o final da festa. Não havia mais clima para estar ali, muito menos para continuar aquele relacionamento. Não sei onde estava com a cabeça de me apaixonar por uma pessoa que era anatomicamente maior que eu. Até pra segurar na cintura dela na hora em que estávamos dançando foi difícil. Olhava pro lado e via o Jorjão no alto dos seus quase dois metros chamando atenção e eu ali agora com um complexo de inferioridade. Tudo isso por causa de um cotovelo no ombro.

Chegando em casa a DR foi fundamental.

- Meu amor, o que aconteceu? De repente parece que você ficou chateado!

- Cláudia, acho melhor a gente não continuar nosso relacionamento.

- Mas por quê? O que houve?

- Não houve nada. É o que é.

- Então o que é?

- São três centímetros. É isso?

- Como assim Rogério?

- Você é três centímetros maior que eu e isso nos distancia demais.

- E desde quando eu ser um pouco maior que você se tornou problema?

- Desde hoje, Cláudia. Que você é maior todos já sabem, era evidente, com o salto ficou ainda maior...

- Ah, mas se o problema é o salto eu não uso mais.

- Não é o salto. Foi você ter se escorado em mim. Me senti um encosto, um balcão de um boteco...

- Mas meu amor, aquilo foi um gesto tão simples.

- Simples pra você, pra mim aquilo foi o fim. Não quero ser encosto pra ninguém.

- Rogério, eu te amo.

- Eu também te amo, mas três centímetros fazem muita diferença.

- Rogerinho...

- Não me chama assim que complica ainda mais.

- Tá bom, Carlos Rogério. Entenda o significado daquele gesto. Odeio usar salto, estava ali ao seu lado há horas passeando por aquele salão lotado, caminhando e sorrindo para conhecer todos os seus amigos. Quando paramos naquela hora, já era uma tortura estar em pé e o único momento de alívio foi quando pude me encostar no seu ombro. E é assim que quero você, meu querido. Nos momentos em que mais precisar terei em ti o apoio que tanto preciso e necessito.

- Oh, Claudinha. Me desculpa! Brigar por causa disso, não faz mesmo o menor sentido.

- Não faz mesmo!

- Pois desce aqui e me beija!

Nenhum comentário:

Postar um comentário