quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Passado. Presente... Futuro?

A incerteza diante do minuto seguinte, da hora que vem, do dia que não chega é um dos maiores conflitos para os seres humanos. Tanto que são inúmeros os filmes e livros que falam sobre máquina do tempo, a possibilidade de conhecer o futuro, voltar atrás no tempo para corrigir algum erro... Afinal quem nunca quis ter saído um pouco mais tarde da boate naquela noite, ter passado antes na farmácia pra ter comprado preservativo, não ter ido a casa dele (a) naquela noite, ter dito não ao invés de sim, ou “melhor não” quando você sabia que a coisa iria piorar... Mas enquanto não se pode mudar o passado, o jeito é tentar adivinhar o futuro. E era isso que aquelas três amigas estavam dispostas a fazer naquela tarde.
A fama de Irmã Isaura já percorria toda a cidade. “Não posso consertar os erros do seu passado, mas te ajudarei a não errar mais no futuro”. Com este slogan, ela atraía centenas de pessoas, todos os dias, para uma tenda colocada no meio de uma praça em um bairro da periferia da cidade. “Até agora ela não errou nada”, eram os comentários de quem ia chegando à praça. “Irmã Isaura disse que meu marido iria morrer. Duvidei até o dia em que o homem cai durinho de cara na sopa na hora do jantar. E olhe que ele tinha uma saúde de ferro”. “Acertar o futuro como essa daí? Tô pra ver nascer outra”. As amigas se aproximavam da fila quilométrica enquanto ouviam vários depoimentos dos feitos da Irmã Isaura.
Clarisse, Magda e Aline viviam situações diferentes. A primeira estava recém-divorciada, a segunda recém-casada e a terceira sempre encalhada.
- Eu vou primeiro. – disse Aline. Quero saber qual o tamanho da pedra que eu joguei na cruz pra nunca ter arranjado um homem que presta nessa vida.
- Amiga, homem nenhum presta. – comentou Clarisse.
- Você só diz isso porque acabou de levar um pé na bunda.  – retrucou Magda.
- Ah, nem vem. Você fala isso porque arranjou um homem bom. Isto é, ele é bom mesmo? – indagou a despeitada Clarisse.
- É ótimo, maravilhoso, nunca tinha sentido o que estou sentindo agora. – falou a convencida Magda.
- Então se tem tanta certeza de que o Arnaldo é tão maravilhoso assim, que você o ama e que serão felizes para sempre, o que veio fazer aqui? – perguntou Aline.
- Ah, o futuro a gente nunca sabe, não é? – respondeu a agora desconfiada Magda.
- Mas espero que a Irmã Isaura saiba. – afirmou Clarisse.
As três estavam angustiadas, já se passavam quase quatro horas naquela fila e ainda havia pelo menos umas dez pessoas na frente delas. A cada indivíduo que saía a expectativa aumentava. A pergunta na saída era sempre a mesma:
- E aí, o que ela te disse?
E as respostas eram as mais variadas. Algumas pessoas saíam incrédulas, outras confiantes... Um jovem e belo rapaz chamou atenção quando saiu.
- Tá vendo que um negócio desse não é capaz de acontecer. Essa mentirosa da Irmã Isaura dizendo que a minha esposa, a Santana, vai me largar para morar nos Estados Unidos com outro homem. Só sendo mesmo. Santana é a mulher mais séria que conheci em toda minha vida. Nem a finada minha mãe é tão séria como minha esposa. Ir embora pro estrangeiro? Onde já se viu um negócio desse?
- Coitado. Mal sabe esse daí que os meninos da rua colocaram um par de chifres na porta dele hoje de manhã, depois que viram a Santana sair toda arrumada, de mala e cuia em um carrão que encostou na casa dela hoje cedo.  – comentou uma senhora que estava na fila. Essa Irmã Isaura não erra mesmo – completou a distinta senhora. E ainda tem o velho ditado: “O corno é o último a saber”.
As amigas, que já estavam quase se deixando vencer pelo cansaço, entreolharam-se e se restava alguma dúvida da credibilidade da vidente, ela acabara de ir embora com o caso do marido traído. O que seriam duas horas a mais em pé, diante da certeza do que iria acontecer no futuro?
Mais duas horas e chegou a vez. Aline se aprontou toda pra ser a primeira das três.
- Pode entrar! – chamou a Irmã Isaura.
Longos 20 minutos se passaram. Magda e Clarisse olhavam-se e tentavam adivinhar o que estava se passando lá dentro. “Qual será o futuro dessa sem-futuro?”, pensavam.
A porta de saída da tenda era por trás, ou seja, a que entrasse logo após Aline, não poderia conversar com amiga para saber o que o futuro reservava.
- Você vai na frente. – disse Magda.
- Eu não. Vai você! – retrucou Clarisse.
- Por que eu? – questionou Magda.
- E por que eu?
- Clarisse, você acabou de se divorciar. Mais do que eu, quer saber o que o futuro te reserva. Eu encontrei o Arnaldo há pouco tempo. Estamos felizes juntos, mesmo que a Irmã Isaura diga que meu futuro com ele não será bom, eu não vou chegar a casa e terminar tudo. Se o futuro é pra ser assim, com suas angústias e decepções, que seja, pois eu sei que vou aprender muito. E você? O que o futuro guarda pra ti?
- Pode entrar! – gritou a Irmã Isaura.
- Tem razão, vou saber agora! – Clarisse riu para Magda, deu um beijo na amiga e entrou.
Meia hora depois, Clarisse sai e vê Magda e Aline conversando em um banco da praça.
- O que você fazendo aqui? E o teu futuro? – perguntou Clarisse à Magda.
- O meu futuro eu mesma escreverei.
- Tudo bem, amiga. E por que a Aline está assim? – Clarisse observava o olhar perdido e um leve sorriso no rosto de Aline.
- É o que estou tentando descobrir. Conta aí, Aline! O que houve lá dentro? – pediu Magda.
- A Irmã Isaura me falou muita coisa sobre estudo, família, trabalho e, é claro, amor. A que me deixou mais aliviada foi quando ela disse que não tinha jogado pedra alguma na cruz. Nesta hora ela olhou bem pra mim e disse: “O homem da sua vida está lá fora. Saia imediatamente, sente em um banco que fica debaixo de um pé de jambo e observe a rua na direção da lua cheia. Ele vai surgir na sua frente e te fazer uma pergunta que você jamais esperaria, mas que saberá exatamente a resposta”. – contou Aline.
- Que coisa mais doida, mulher de Deus. E você vai ficar parada aí esperando esse tal homem? – perguntou Magda.
- Mas é claro. Vou deixar passar uma oportunidade dessa?
- Ai, amiga, você vai me desculpar, mas estou muito cansada e não estou disposta a esperar esse tal príncipe encantado neste fim de mundo não. Até porque não gostei muito do que essa tal Isaura me contou não. – disse Clarisse.
- Eu também não vou fica. Até porque o Arnaldo está ligando e pedindo pra eu voltar. Boa sorte tá?
- Tudo bem, vou aguardar mais um pouco. Quero saber se a Irmã Isaura realmente acertou o meu futuro.
Já era tarde da noite e Aline lá, olhando para a rua na direção da lua esperando o tal homem de sua vida. Estava cansada das horas que ficara em pé e agora da longa espera por alguém que nem mesmo ela sabia se ia chegar.
- Será que a Irmã Isaura errou dessa vez?  - baixou a cabeça e começou a pensar sobre os erros que cometera no passado e sobre as incertezas do futuro. Foi quando ouviu passos de alguém se aproximando, levantou a cabeça e a luz forte vinda do poste impediu que ela visse o rosto do homem que se ajoelhou aos pés dela.
- Estive com a Irmã Isaura esta tarde e ela me disse que eu deveria vir aqui à noite porque uma reviravolta ia acontecer na minha vida. Minha esposa iria me abandonar e que eu encontraria uma mulher no banco da praça a quem eu deveria perguntar: é você?
Aline levantou o rosto daquele homem, olhou profundamente em seus olhos e respondeu:
- Sim, sou eu!
Beijaram-se longamente tendo a lua como testemunha, enquanto no meio da praça irmã Isaura terminava mais um dia de trabalho e atravessava a praça enquanto dizia:
- O ontem é passado, o amanhã é um mistério e o hoje é uma dádiva, por isso se chama presente. Mas do mistério, eu entendo!

Nenhum comentário:

Postar um comentário